
A proteção de meninas e mulheres ganhou apoio do corpo docente na Raposa Serra do Sol. O projeto “Acesso à Justiça de Meninas e Mulheres de Bonfim e Normandia” chegou à comunidade indígena Xumina, na Terra Indígena, em Normandia. Pela primeira vez, o município recebeu a formação promovida pelo Tribunal de Justiça de Roraima (TJRR) acerca do tema.
Esta é a quinta reportagem da série especial sobre o projeto Meninas e Mulheres de Bonfim e Normandia. Após o lançamento da iniciativa pelo Judiciário roraimense, que apresentou as bases do programa voltado ao acesso à Justiça e à proteção de meninas e mulheres na região de fronteira.
O evento reuniu 30 participantes, em 13 de outubro, incluindo professores, gestores e servidores escolares, em uma ação que pretende transformar dados alarmantes de violência em mobilização social e educativa dentro das comunidades indígenas.

O professor Luiz Fidelis, da Escola Estadual Indígena Tuxaua Evaristo, evidenciou o impacto, afirmando.
“Esse curso abriu a nossa mente e trouxe clareza sobre onde buscar soluções para casos de violência doméstica e sexual. A partir de agora, queremos levar esse conhecimento para as crianças, os jovens e toda a comunidade.”.
|
|
Segundo a psicóloga do TJRR, Isabeau Cristina de Sousa Bezerra, a proposta vai além da capacitação, sendo uma estratégia para ampliar a articulação da rede de proteção local.
“É uma região majoritariamente indígena, então é essencial considerar as especificidades culturais e as dinâmicas comunitárias. A escola tem um papel central na vida social e política das comunidades indígenas, e trabalhar a prevenção dentro dela significa alcançar todo o entorno social,” explicou Isabeau.
|
|
PANORAMA DE VIOLÊNCIA EM RORAIMA

A iniciativa está alinhada às diretrizes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ao Plano de Gestão do TJRR 2025-2027, promovendo a articulação entre o Judiciário e a comunidade. Por trás dessas ações, há um diagnóstico preocupante: os índices de violência contra meninas e mulheres na região de fronteira, especialmente em Bonfim e Normandia, estão entre os mais altos do estado, revelando uma realidade marcada pela subnotificação, isolamento geográfico e barreiras culturais.
Segundo dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH), que monitora o Disque 100, o Brasil registrou, entre janeiro e setembro de 2025, 3.434.869 violações. Em Roraima, o painel contabilizou 670 denúncias e 4.788 violações. Dessas denúncias, 322 envolviam mulheres vítimas, das quais 234 eram crianças e adolescentes. Houve uma leve redução de 5,2% nas denúncias em relação a 2024, mas a violência persiste.
A psicóloga Isabeau Bezerra observa que esses dados indicam a necessidade de manter ações contínuas.
“Esses números não são apenas estatísticas; eles representam vidas. Quando a gente leva informação e acolhimento às comunidades, estamos rompendo ciclos de silêncio e fortalecendo o papel da escola como espaço de transformação”.
O panorama municipal revela um cenário igualmente desafiador. Bonfim registrou 16 denúncias, das quais 7 envolveram meninas e adolescentes, resultando em 51 violações. Normandia, por sua vez, somou 14 denúncias, 8 envolvendo mulheres vítimas, incluindo 6 meninas e adolescentes, totalizando 106 violações. A alta densidade de casos em comunidades de população reduzida enfatiza a urgência de políticas públicas preventivas e intersetoriais.
PROFESSORES COMO MULTIPLICADORES DA JUSTIÇA

O projeto “Meninas e Mulheres de Bonfim e Normandia” atua na formação de professores, gestores e lideranças indígenas para reconhecer sinais de abuso, orientar famílias e fortalecer a rede de proteção local. Os setores responsáveis pela execução (Cevid e CIJ) propõem unir educação, direito e cidadania em uma mesma frente de atuação.
A servidora Natália Menezes ressalta que as capacitações são mais do que palestras informativas, sendo ferramentas de empoderamento coletivo.
“O projeto nasceu de estudos realizados pelo Poder Judiciário sobre os altos índices de violência em Bonfim e Normandia. As formações capacitam os professores para que se tornem multiplicadores, pessoas capazes de orientar alunos e famílias sobre seus direitos e sobre como acessar os canais de denúncia. Estamos falando de transformar conhecimento em ação social.”.
|
|
Outros dados de Roraima, do Ligue 180, mostram que, entre janeiro e agosto de 2025, foram registrados 604 episódios, 102 denúncias e 106 protocolos de atendimento no estado. A faixa etária mais afetada é a de 20 a 24 anos, retrato de mulheres jovens e vulneráveis, muitas delas indígenas ou residentes em áreas rurais.

Na comunidade Xumina, o tema é sensível, mas foi tratado com acolhimento e engajamento. O professor Cláudio Cipriano Sampaio, que leciona História e Geografia, reconheceu a importância da formação.
“Nós vivemos essas situações na comunidade, mas muitas vezes não tínhamos ferramentas para agir. Esse curso trouxe o conhecimento da lei e nos deu instrumentos para trabalhar a prevenção dentro da escola. Vamos desenvolver mini-projetos pedagógicos para combater os fatores negativos e formar cidadãos conscientes dos seus direitos e deveres,” afirmou Sampaio.
|
|
A professora indígena Juliane Paulino, também da Escola Tuxaua Evaristo, salienta que o curso abriu espaço para que a violência deixe de ser tabu.
“Na nossa comunidade, ainda há mulheres e crianças que sofrem caladas. Esse projeto traz luz e permite o diálogo. Precisamos continuar com essas ações nas terras indígenas, para que possamos orientar e proteger nossas famílias.”.
|
|
A capacitação em Xumina está inserida na política de interiorização da Justiça, que busca chegar onde o Estado raramente alcança.

Isabeau Bezerra concluiu: “Cada professor que entende os mecanismos legais se torna um agente da Justiça. O que começa como uma formação pode se tornar a mudança de toda uma comunidade.”
ESTRATÉGIA DA REDE LOCAL

Esta iniciativa faz parte de um conjunto de estratégias do Tribunal de Justiça de Roraima voltadas ao enfrentamento da violência de gênero e à promoção do acesso à justiça em áreas de difícil alcance institucional. O projeto é conduzido pelo Gabinete da Juíza Auxiliar da Presidência, pelas Coordenadorias da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (CEVID) e da Infância e Juventude (CIJ). O Núcleo de Projetos e Inovação (NPI) é responsável pela formatação e documentação da ação, que conta com o patrocínio do presidente do TJRR, desembargador Leonardo Cupello, a partir de demanda da juíza Lana Leitão Martins.
Acessibilidade
O site do TJRR oferece recursos de acessibilidade por meio do sistema Rybená, que facilita a navegação e a compreensão de conteúdos digitais por pessoas com deficiência. Para ativar essas funcionalidades, basta clicar em um dos ícones para utilizar as opções disponíveis no próprio portal.
Texto: Eduardo Haleks - Jornalista / Wesley Vieira - Estagiário de Jornalismo
Fotos: NUCRI/TJRR
DEZEMBRO/2025 - NUCRI/TJRR
Fotos: NUCRI/TJRR
DEZEMBRO/2025 - NUCRI/TJRR


